Com mandado de prisão preventiva decretado pelo STF, a permanência da deputada em solo americano abre um complexo labirinto jurídico e diplomático. A alegação de “crime político” e a postura do governo Trump são vistos como os principais obstáculos.
Com a expedição de um mandado de prisão preventiva pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e a confirmação de que a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) se encontra nos Estados Unidos, a discussão agora se volta para um processo complexo e incerto: sua eventual extradição para o Brasil. Especialistas em direito internacional e analistas políticos apontam que o caminho para trazê-la de volta ao país é repleto de obstáculos jurídicos e, principalmente, políticos.

O Argumento do “Crime Político”
O principal desafio para um pedido de extradição bem-sucedido reside no tratado firmado entre Brasil e Estados Unidos. Como a maioria dos acordos do gênero, ele contém uma cláusula de exceção que veda a extradição por crimes de natureza política ou por atos conexos a eles.
A estratégia da defesa de Carla Zambelli, segundo analistas, será inevitavelmente a de enquadrar as acusações e a condenação que ela enfrenta no Brasil como resultado de perseguição política. A defesa deverá argumentar que as decisões do ministro Alexandre de Moraes e do STF não são puramente técnicas, mas sim uma retaliação às suas posições políticas alinhadas ao bolsonarismo. A palavra final sobre se os crimes se enquadram ou não na categoria de “políticos” caberá às autoridades norte-americanas, e não às brasileiras.
Este tipo de argumento já teve sucesso em casos envolvendo outros apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro. O blogueiro Oswaldo Eustáquio, por exemplo, teve seu pedido de extradição negado pela Espanha, que considerou haver “motivação política” na solicitação brasileira.
O Cenário Político nos EUA
Ainda mais determinante que a análise jurídica pode ser o fator político. A decisão final sobre conceder ou não uma extradição nos EUA é do Poder Executivo, especificamente do Secretário de Estado. A atual administração do presidente Donald Trump já manifestou, através de comunicações oficiais e declarações, seu descontentamento com as decisões do ministro Alexandre de Moraes que afetam plataformas e cidadãos americanos.

Reportagens recentes da imprensa brasileira, citando fontes próximas a bolsonaristas nos EUA, indicam que o governo Trump já estaria sinalizando que um eventual pedido de extradição de Zambelli seria rejeitado. A avaliação é que a Casa Branca estaria mais inclinada a oferecer proteção política a aliados do ex-presidente Bolsonaro do que a colaborar com decisões judiciais de um magistrado que é alvo de críticas por parte de setores conservadores americanos. Zambelli, inclusive, já declarou que avalia pedir asilo político a Trump.
O Processo Legal
O trâmite de um pedido de extradição é longo e burocrático. Após a inclusão do nome de Zambelli na lista de difusão vermelha da Interpol, o governo brasileiro, via Ministério da Justiça e Itamaraty, precisa formalizar o pedido aos Estados Unidos. O caso então é analisado pelo Departamento de Estado e pelo Departamento de Justiça americanos. Em seguida, é levado a uma corte federal, que avalia se os requisitos formais do tratado foram cumpridos, como a “dupla criminalidade” (o ato ser crime em ambos os países).
Mesmo que a corte federal americana dê um parecer favorável à extradição, a decisão final, como mencionado, é do Secretário de Estado, que pode negá-la por razões políticas ou de interesse nacional.
Embora o STF e a Procuradoria-Geral da República entendam que os crimes pelos quais Zambelli foi condenada (no caso da invasão ao sistema do CNJ) e é investigada (porte ilegal de arma e trama golpista) são crimes comuns e não de opinião, a percepção política em Washington será o fator decisivo. Diante deste cenário, a extradição da deputada se apresenta como uma batalha jurídica e diplomática de resultado altamente incerto para o Brasil.