Ex-ajudante de ordens afirma que busca por provar suposta fraude eleitoral era o ‘primeiro passo’ e a justificativa para uma ruptura institucional. Frustração com relatório das Forças Armadas teria levado Bolsonaro a desistir.
Em um dos trechos mais reveladores de seu interrogatório no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta segunda-feira, 9 de junho, o tenente-coronel Mauro Cid afirmou que “encontrar uma fraude nas urnas eletrônicas sempre foi a grande preocupação, a grande missão do presidente Bolsonaro”. A declaração, feita ao ministro Alexandre de Moraes, detalha como a campanha de descrédito ao sistema eleitoral era a base fundamental para a trama golpista investigada pela Corte.

Cid, que depôs por mais de quatro horas como réu e colaborador, explicou que a comprovação de uma suposta fraude era vista pelo então presidente como a “justificativa” que validaria uma ação de ruptura institucional, como a decretação de um estado de sítio ou uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). Segundo o ex-ajudante de ordens, este era o “primeiro passo” de todo o plano.
Conforme a reportagem do G1, Mauro Cid detalhou aos investigadores que Jair Bolsonaro exerceu forte pressão sobre o então ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, e sobre os comandantes das Forças Armadas para que o relatório sobre a fiscalização das urnas apontasse alguma irregularidade grave.
O ponto de virada, segundo Cid, ocorreu quando o relatório final do Ministério da Defesa, divulgado em novembro de 2022, concluiu que não havia sido encontrada nenhuma fraude no processo eleitoral. A frustração de Bolsonaro com o resultado do documento foi imensa. De acordo com o depoimento de Cid, após a divulgação do relatório que não corroborava suas teses, o então presidente teria dito que não havia “mais o que fazer” e que tinha “entregue os pontos”, indicando uma desistência da tentativa de golpe por falta da premissa que a sustentaria.

Esta parte do testemunho de Mauro Cid é considerada de extrema importância para a acusação, pois estabelece uma linha direta e cronológica entre a narrativa de contestação das urnas e o planejamento de um golpe de Estado. A fala do ex-ajudante de ordens reforça a tese da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que os ataques ao sistema eleitoral não eram apenas retórica de campanha, mas sim uma etapa calculada de um plano para subverter a democracia.
O interrogatório de Mauro Cid foi o primeiro dos oito réus do chamado “núcleo principal” da trama golpista. Os depoimentos dos demais acusados, incluindo o próprio Jair Bolsonaro, continuarão a ser colhidos pelo STF ao longo da semana.