Crescimento de despesas obrigatórias ameaça sustentabilidade do arcabouço fiscal -

Crescimento de despesas obrigatórias ameaça sustentabilidade do arcabouço fiscal

Especialistas em contas públicas alertam que o arcabouço fiscal, aprovado em 2023, enfrenta sérios riscos de se tornar insustentável nos próximos anos. O conjunto de regras, que limita o crescimento das despesas públicas a 70% do aumento das receitas do ano anterior, com um teto de 2,5% acima da inflação, foi criado para equilibrar as contas do governo. No entanto, o aumento rápido das despesas obrigatórias está comprometendo sua eficácia.

Despesas como pensões, salários de servidores e programas sociais crescem acima do limite permitido, reduzindo o espaço para despesas discricionárias, que financiam investimentos em saúde, educação e infraestrutura. Projeções indicam que, até 2027, o governo federal pode enfrentar um déficit de R$ 10,9 bilhões nessas despesas, o que pode levar à paralisação de programas como a Farmácia Popular e a fiscalização ambiental.

A situação deve piorar com a inclusão dos precatórios, dívidas judiciais que o governo deve pagar, no limite de gastos a partir de 2027. Essa medida adicionará R$ 60,1 bilhões às despesas, tornando ainda mais difícil manter o equilíbrio fiscal. Mesmo que o limite do arcabouço seja recalculado, o espaço para despesas discricionárias será insuficiente, com estimativas de apenas R$ 122,2 bilhões em 2027, o menor nível histórico, equivalente a 1,27% do PIB.

Economistas como Marcus Pestana, do Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, preveem uma “estranulação orçamentária” em 2027, com aumento da dívida pública, queda nos investimentos e sufocamento das despesas discricionárias. Paulo Bijos, ex-secretário-executivo do Ministério do Planejamento, defende reformas estruturais, como a desindexação de despesas e a desvinculação de gastos obrigatórios, para preservar o orçamento. Jeferson Bittencourt, da ASA, calcula que os cortes nas despesas obrigatórias precisariam ser três vezes maiores que o pacote de dezembro de 2024 para manter os níveis de 2026.

Gabriel Barros, da ARX Investimentos, vai além, classificando o arcabouço como “matematicamente inconsistente”. Segundo ele, o modelo só foi cumprido até agora por meio de contabilidades questionáveis, e há um alto risco de paralisação do governo, ou “shutdown”, já em 2026. Outros especialistas, como Carlos Kawall, sugerem limitar o crescimento do salário mínimo à inflação e revisar os parâmetros da previdência social para aliviar a pressão fiscal.

A trajetória da dívida pública também preocupa. Projeções oficiais indicam que a dívida bruta alcançará 84,2% do PIB em 2028, mas o mercado financeiro estima que ela pode ultrapassar 90% até o final da década. Esse cenário aumenta os riscos de uma crise de confiança na economia brasileira, dificultando a captação de recursos e elevando os juros.

O governo, por sua vez, não apresentou medidas significativas para conter o crescimento das despesas obrigatórias no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026. Também não respondeu a questionamentos sobre a possibilidade de excluir os precatórios do cálculo do resultado primário ou sobre planos para cortes robustos nos gastos. A ausência de ações concretas reforça as dúvidas sobre a viabilidade do arcabouço fiscal atual.

A necessidade de uma nova reforma fiscal é consenso entre os especialistas, que apontam 2027 como um ano crítico, quando o próximo governo terá que enfrentar esses desafios. Sem ajustes, o Brasil pode enfrentar dificuldades para financiar políticas públicas essenciais, comprometendo o desenvolvimento econômico e social do país.

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